Mostrar novas alternativas, demonstrar em números a rentabilidade possível com alguma mudança de manejo e apresentar mudanças graduais são algumas estratégias usadas pelas mulheres para serem ouvidas dentro da propriedade da família
Texto: Marluce Corrêa Ribeiro – Jornalista e Redatora do Portal Agromulher
Por onde quer que você vá, em vários cantos do Brasil, é cada vez mais comum encontrar mulheres que estão ocupando seu espaço também frente aos negócios da família. As sucessoras estão chegando com muita motivação e energia para tocar a atividade que seus pais trouxeram até aqui.
Mas quem pensa que ser aquela que sucede os pais na atividade é tarefa fácil, está enganado. Os desafios são incontáveis. Mas elas não desistem, porque o brilho nos olhos é maior que as barreiras para chegar lá.
Elas são mulheres que decidem lutar por seu espaço na atividade, sem sair da propriedade e do negócio da família. Mulheres motivadas e guerreiras que provam, todos os dias, o quanto podem somar e contribuir para uma atividade mais lucrativa e sustentável. Mulheres que abrem mão de estar em outros lugares, em outras empresas – às vezes até mais estruturadas do que a de seus pais – para tocar um negócio que também é seu. Mulheres que se encontraram e se enxergam como indispensáveis para manter o negócio da família de pé. Mulheres que escolheram estar ali, por opção, por desejo, por vontade de ser o diferencial e o futuro que a sua propriedade precisa. Ou mulheres que precisaram estar ali inicialmente por um motivo maior e acabaram se encontrando na atividade e na sucessão.
É o caso de Andrea Van Riel e Naiane Xavier Hommerding. Mulheres, sucessoras, profissionais do Agro, com uma família de agricultores do Sul do Brasil. Elas têm tantas coisas em comum, que nem elas imaginam. Elas são o retrato de tantas outras mulheres sucessoras espalhadas pelo país. Mas o que essas mulheres enfrentam? O que elas buscam? Com o que elas sonham? Continue sua leitura e venha descobrir um pouco dessas histórias de mulheres sucessoras inspiradoras.
Confiança conquistada
Assim como em qualquer outra empresa, na empresa familiar é preciso conquistar a confiança dos seus líderes e gestores. E essa conquista é realizada dia após dia, em cada pequena ação, ideia, inovação proposta, aplicada e que gera resultado satisfatório. Para Andrea Van Riel foi exatamente assim. A filha mais velha de três irmãs relata que conquistar o respeito e a admiração não é fácil. “Precisamos manter o foco e produzir. Ninguém questiona um trabalho bem feito. Acredito que os resultados falam por si só, e é isso que destaca um bom profissional”, pondera a Engenheira Agrônoma e Mestre em Proteção de Plantas.
Andrea é filha de produtores rurais, que atualmente trabalham com as culturas de soja, milho e aveia, na região de Não Me Toque – RS. Assim como tantas outras mulheres do agro, esteve inserida nesse setor durante toda sua vida, até que, em determinado momento, começou a contribuir com a família, inicialmente na parte administrativa e financeira e, posteriormente, também assumiu a parte técnica e operacional. “A confiança veio com o tempo, mostrando meu trabalho com dedicação e empenho, sugerindo algumas mudanças de forma gradual e que pudessem ser comparadas com o que estava sendo feito para que meus pais pudessem observar as vantagens e benefícios que essa mudança poderia trazer”, relata ela.
Força feminina
Dentro da empresa familiar, inúmeras habilidades tipicamente femininas podem contribuir muito para o bom desenvolvimento do negócio e da equipe. Andrea Van Riel relembra algumas características das mulheres que podem contribuir muito com o andamento do negócio. “As mulheres são mais atenciosas e desenvolvem várias tarefas ao mesmo tempo, além de termos um diferencial para a gestão e a inovação, o que nos traz muitas vantagens e oportunidades para propor novas ideias e organizar informações das atividades que auxiliam na tomada de decisões. Vejo a força feminina cada vez mais presente no agro, em diversos setores dentro do segmento: sucessão familiar, assistência técnica, em cargos de decisão e comando nas corporações. Acredito que isso vai continuar acontecendo de uma forma mais expressiva porque as jovens mulheres podem se espelhar e se motivar vendo essas mulheres fortes, decididas e empenhadas desenvolvendo seu trabalho e alcançando seus objetivos”, comenta ela.
Para Naiane Hommerding, o grande diferencial feminino está na capacidade e no “feeling” das mulheres para fechar negócios. “As mulheres são organizadas e ainda tem uma visão mais ampla de tudo”, declara. E ela ainda considera uma grande oportunidade o espaço que vem sendo ocupado pelas mulheres no agro. “Cada vez mais temos mulheres entrando neste ramo e isso nos torna mais fortes e mais aptas a enfrentar estes desafios e conquistar nosso espaço na agricultura. Quanto mais mulheres tivermos a frente dos negócios na agricultura, mais rápido iremos acabar com o preconceito que ainda existe e juntas seremos mais fortes. Cada vez mais vemos mulheres gerindo negócios de sucesso e isso mostra a capacidade que as mulheres têm de gestão e administração dos seus negócios”, salienta ela.
Experiência e inovação: uma união de sucesso
O grande diferencial da sucessão familiar é a união entre a experiência dos pais e a inovação apresentada pelos filhos e filhas. O equilíbrio entre essas duas coisas tende a gerar uma atividade rentável, com um negócio cada vez mais promissor e, o melhor de tudo, com a previsão de que a empresa rural será mantida pela próxima geração.
Sem dúvida, esse encontro de gerações não é fácil. Tudo deve ser feito com muita cautela e flexibilidade para que não haja conflitos que possam comprometer a relação familiar e até mesmo os negócios. Os filhos precisam ser pacientes e entender que o processo é gradual. Por outro lado, os pais precisam estar abertos para novas sugestões e ideias vindas dos filhos.
Andrea Van Riel ressalta que algumas vezes há diferenças de opiniões entre os envolvidos, mas o respeito é a base da relação. “É importante respeitar a experiência e todos os anos de trabalho de nossos pais. Só eles sabem o quanto trabalharam para chegar onde estão. E a oportunidade de aprender com quem tem anos de experiência significa mais do que qualquer discussão de ideias que possa ocorrer no dia a dia. Por outro lado, também acredito que a nossa contribuição por meio da tecnologia e inovação pode contribuir para o processo de produção, tornando as atividades mais rentáveis”, declara.
“Sou eu quem fecha o negócio”
Para muitas mulheres, não é fácil se autoafirmar e mostrar que são de fato as responsáveis pelo negócio, que são as donas daquela boa ideia, que dão a palavra final na negociação. Entretanto, sempre é preciso se posicionar e deixar claro sua função, seu lugar e suas responsabilidades. A partir daí, o trabalho bem feito trará como resultado a confiança e segurança de quem trabalha com você ou dos seus clientes. Naiane Hommerding sabe bem o que é isso. Quando precisou assumir os negócios da família por questões de saúde da sua mãe, enfrentou algumas dificuldades. Além de ser mulher, em aparência sempre apresentou ser mais nova do que de fato é. E isso gerava uma desconfiança dos clientes ou dos fornecedores. Até que, passo a passo, Naiane começou a se posicionar, mostrou pulso firme, e as pessoas passaram a enxergar que, sim, ELA é a responsável por fechar os negócios e tomar a decisão.
Ela, como filha mais nova de três irmãs, não tinha muito contato com o agro até precisar assumir os negócios da família, 6 anos atrás, no município de Carazinho – RS. A jovem, graduada em Administração, acredita que na atividade o “viver a prática é fundamental, acompanhar o processo de plantio do início ao fim, identificar os produtos que funcionam ou não, andar na lavoura com os agrônomos, buscar entender as doenças”. Por conta de sua formação, a parte de fechar negócios e controlar pagamentos sempre foi a parte fácil de suas funções. Mas Naiane, assim como muitas outras agro mulheres que não viveram em contato direto com o agro desde a infância, buscou entender o processo, conhecer os produtos, as empresas, participar de eventos, buscar capacitação e orientação de profissionais da área técnica e de seus próprios funcionários para que ganhasse cada vez mais confiança em administrar o negócio.
Planejamento para a sucessão
O ideal dentro do ambiente familiar é que a sucessão seja preparada com bastante antecedência, que as filhas e os filhos sejam inseridos no negócio o quanto antes para que entendam, conheçam e ganhem experiência para facilitar seu trabalho como sucessor. Entretanto, nem sempre esse preparo e planejamento é possível. E quando a jovem ou o jovem são surpreendidos com a responsabilidade de assumir os negócios da família de repente, ela (e) precisa ter foco, vontade e “jogo de cintura” para enfrentar os inúmeros desafios.
A história de Naiane Hommerding com o agro é o retrato de tantos outros casos de jovens que precisam assumir os negócios da família sem ter tido uma preparação para tal função. A jovem assumiu os negócios familiares quando sua mãe descobriu um sério problema de saúde. “Foi tudo muito rápido e posso dizer que entrei de ‘paraquedas’ no negócio, pois minha mãe administrou por 12 anos sozinha sem dividir conosco as informações do negócio e isso tudo dificultou bastante no meu início pela falta de experiência e conhecimento. Mas nem por isso eu desisti, muito pelo contrário, tive força de vontade. Não foi fácil, enfrentei muitos obstáculos e até mesmo um certo preconceito. No início, eu sentia que às vezes me olhavam e pensavam: ‘como essa guriazinha vai se responsabilizar por tudo?’ Mas me mantive forte, busquei meu respeito e meu espaço e me impus quando precisei. Então com o tempo tu conquista a confiança das pessoas, as oportunidades começam a surgir, cada vez mais empresas te procuram e cada vez mais tu se tornas respeitada, e isso te traz mais confiança e segurança para seguir adiante”, relata a jovem sucessora.
Conselhos de quem vive a sucessão
Tanto Naiane Hommerding quanto Andrea Van Riel são mulheres que vivem a sucessão e sabem exatamente os desafios e conquistas desse caminho. E como sucessoras bem sucedidas, elas falam a todos aqueles que buscam a sucessão ou que ainda não atuam junto a família, mas tem esse desejo.
“Se eu puder dar um conselho para aquelas mulheres que ainda tem seus pais ativos trabalhando no negócio, eu digo: busquem conhecer o negócio, demonstrem interesse, participem do dia a dia, busquem informações, vão se habituando ao negócio, tentem aprender com o seu pai ou mãe, peça para que lhe ensinem, falem da importância de eles
terem alguém para poder dar continuidade no negócio deles, mostrem que todo o esforço e trabalho deles vai continuar sendo valorizado no futuro. Eu acredito que é muito mais tranquilo assumir um negócio que você já tem conhecimento, que você já participa e que você conhece, automaticamente você já cria uma intimidade, já aprende a valorizar o seu negócio e cuidar dele.
E para aquelas mulheres que por alguma questão não puderam se envolver nos negócios da família ou por resistência ou por falta de incentivo, ou até mesmo por preconceito, e este negócio acabou caindo sobre sua mão, não desista, persista, vá atrás, confie em você mesma, busque o seu espaço, prove para as pessoas que esse negócio vai continuar andando bem e até melhor com a sua presença. Participe de eventos, de dias de campo, busque conhecer as novidades, se atualizar e não tenha receio por ser a única mulher no grupo (como acontece muitas vezes). Essa é a hora de você mostrar o seu lugar, se manter firme e mostrar a sua seriedade sobre o negócio. Que possamos cada vez mais ver mulheres à frente da agricultura. Nós temos um grande potencial! Não deixe de explorar o seu potencial. Vá a luta, juntas somos mais fortes!” Naiane Xavier Hommerding, Administradora e Sucessora familiar
“Trabalhem muito com empenho e dedicação, mostre que você tem competência para desenvolver as atividades. Busque sempre por conhecimento, participe de palestras e dias de campo. No agro ocorrem muitas mudanças, sempre tem novas tecnologias e é importante estar ciente das novidades
Quando tiver dificuldades ou dúvidas sobre algum assunto, converse com pessoas que já passaram por isso, elas irão compartilhar experiências e te ajudar a superar os desafios. Atuar em um setor predominantemente masculino não é fácil, mas saber que outras mulheres passaram por isso e superaram os desafios, faz com que nós busquemos o mesmo caminho de superação.
Aproveitem a oportunidade de aprender com seus pais, eles têm muita experiência vivenciadas na prática. Nenhuma diferença de opinião deve ser maior que a chance de aprender com quem está ao nosso lado disposto a compartilhar anos de aprendizado. Aproveitem!” Andrea Van Riel, Engenheira Agrônoma e Sucessora familiar